Foto: Fábio Costa Pinto |
Primeira Caravana Intercultural Indígena recebeu denúncia de crimes eleitorais na região do Descobrimento
Várias comunidades indígenas não votaram no primeiro turno
das eleições, no último dia 2 de outubro. Gostariam de votar, tinham escolhido
seus candidatos, mas não puderam sair de suas aldeias, o que resultou em uma
abstenção de 30%. A eleição em Prado (BA),
onde vivem seis mil indígenas, cidade com maior número proporcional de
indígenas da Bahia, teve 27,84% de abstenção.
Segundo relatos, além de coação houve até fechamento de
passagens em estradas, para impedir que os indígenas votassem. Estas denúncias foram
ouvidas por mais de 100 participantes da I Caravana Intercultural Indígena, que
passou pela Região do Descobrimento no último final de semana, entre os dias 15
a 17 de outubro.
Organizada pela Associação dos Docentes da UNEB (ADUNEB) e
pelo Centro de Estudos e Pesquisas Intercultural da Temática Indígena (CEPITI –
Campus da UNEB de Teixeira de Freitas), a expedição visitou comunidades de
quatro municípios, conhecendo de perto a realidade das aldeias indígenas Pataxó
da região.
Crime eleitoral
“Cotidianamente a população indígena e a de baixa renda já
está constrangida e aterrorizada em sua mobilidade. Faltou transporte, sim. Mas
no dia das eleições no primeiro turno, houve também um fluxo de veículos com
grupos de homens desfilando para intimidar, muitas vezes exibindo armas” –
relataram os denunciantes locais, apoiadores da causa indígena, como o
jornalista Hilton Viotti, colega membro da ABI – Associação Brasileira de
Imprensa – e que participou da Caravana.
Segundo o jornalista, nem daria para especificar uma aldeia
no Prado, pois a coação foi visível em todo o território. “Com isso, muitos
ficaram amedrontados e deixaram de sair de suas comunidades, para exercer seu
direito ao voto. O TRE e o TSE precisam tomar medidas urgentes para combater
este crime, garantir a participação dos indígenas no segundo turno e levantar
se este caso ocorreu apenas aqui no sul da Bahia ou se não é um caso isolado” –
alerta Hilton.
As autoridades deveriam providenciar ônibus para levar os
eleitores indígenas às zonas eleitorais, e garantir sua segurança. O cacique
Jovino e sua esposa Maria, da Aldeia Nova, denunciaram que sua comunidade ficou
impedida de votar por causa do cerco armado por pistoleiros e fazendeiros que
atacam sua aldeia.
Considerando o posicionamento estratégico da Aldeia Nova e
das estradas de acesso das outras aldeias, situadas na fronteira dos municípios
de Itamaraju/Prado e Porto Seguro, fica evidente que todos os Pataxó desta área
se encontram encarcerados nas suas próprias comunidades. Situação que ainda não
foi resolvida, mesmo depois de instalada a Força Tarefa designada pela
Secretaria de Segurança Pública do Estado da Bahia, no último mês.
Para a Professora Maria Geovanda Batista, Coordenadora do
CEPITI/UNEB e docente do Colegiado dos Cursos de Licenciatura Intercultural em
Educação Escolar Indígena e Pedagogia Intercultural, uma das idealizadoras da I
Caravana, “o TRE deve apurar a responsabilidade deste cerceamento no primeiro
turno das eleições, em toda a zona fronteiriça que compreende as áreas
retomadas ou auto demarcadas no entorno do Monte Pascoal e Vale do Kaí. O que
percebemos através da Caravana é uma situação de encarceramento, a mesma
estratégia vem sendo a alguns anos denunciada por moradores dos morros no Rio
de Janeiro. Não se trata do cerceamento do direito ao voto isoladamente, o que
já seria grave o bastante.”
A primeira vez que este assunto veio à tona foi logo que a
Caravana chegou ao Monte Pascoal. Os
participantes ouviram atônitos esta e outras denúncias. Representantes das Defensorias da União e do
Estado, da CNDH, das organizações indígenas e a própria ouvidora da Defensoria
Pública do Estado, presentes na reunião, prometeram tomar medidas
urgentes. O MPF – Ministério Público
Federal também foi acionado.
Violações a Direitos
O Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos
Humanos, coalizão que reúne 45 organizações e movimentos sociais, participou de
uma missão emergencial em conjunto com o Conselho Nacional dos Direitos Humanos
(CNDH) para verificar violações a direitos humanos aos territórios indígenas do
povo Pataxó, em especial os que se encontram em áreas de retomadas.
A Defensoria Pública da União tem atuado em mais de 30
processos dos indígenas contra os fazendeiros denunciados por agressões,
ameaças e assassinatos.
A I Caravana foi idealizada neste contexto de violência e
violações, articulando uma rede de entidades que vem reivindicando junto às
autoridades proteção e justiça para os povos originários. A rede de
solidariedade se consolidou nesta caravana, e continuará desenvolvendo ações
até que seus direitos estejam garantidos, as questões pacificadas. E que sejam
punidos aqueles que contratam mercenários e pistoleiros para assassinar e tomar
posse do que restaram dos Territórios Indígenas.
União
A Caravana, que abraçou os Pataxó no Vale do Cahy, TI (Terra
Indígena) Comexatiba e na TI Barra Velha, aos pés do Monte Pascoal, partiu de
Salvador na sexta-feira passada. Na segunda-feira dia 17, foi encerrada com uma
Aula Pública em Teixeira de Freitas.
No encerramento destacou-se a urgência do despertar da
sociedade para a importância da demarcação das terras indígenas, devolvendo aos
Pataxós e às demais etnias o pouco que restou de seus territórios imemoriais,
por direito já consagrado na Constituição Brasileira.
Foi aprovada a proposta de criação de um grupo de trabalho
de comunicação, envolvendo as assessorias de todas as entidades participantes
do coletivo, para planejamento estratégico, criação de conteúdo (com captação
de imagens) e distribuição de forma permanente, para dar visibilidade à
causa. O grupo inicia os trabalhos com
membros da ABI - Associação Brasileira de Imprensa, Sindicato dos Jornalistas
Profissionais da Bahia e da Assessoria de Comunicação (Ascom) da ADUNEB.
* Fábio Costa Pinto Jornalista baiano, membro do Conselho Deliberativo da ABI que
representou a entidade na Caravana
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